Saúde e Bem Estar


Enfrentar o novo coronavírus implica também cuidados com a saúde mental

Atenção à saúde mental: o isolamento social e o excesso de más notícias podem impactar e até agravar problemas como depressão e ansiedade, por exemplo
31/03/2020 Correio do Povo

Os efeitos provocados pela pandemia do novo coronavírus vão além dos prejuízos diretos na saúde e na economia. A quarentena, o isolamento social e o excesso de más notícias podem impactar também na saúde mental e, até mesmo, agravar riscos a pacientes que já se tratam de depressão e ansiedade, por exemplo. “Esta é uma situação que perturba a todos, em maior ou menor grau”, lembra a médica psiquiatra Clarice Kowacs. Segundo a especialista, inevitavelmente, todos nós teremos perdas, sejam elas com a saúde, familiares e financeiras, por exemplo. De crianças a profissionais de saúde, que atuam na linha de frente ao atendimento, e à população, não haverá quem não seja afetado por este turbilhão de emoções e sentimentos causados pelo período de clausura. “A gente vai saber os efeitos desta situação nos próximos meses, anos”, acredita Clarice. Mas há alternativas que podem tornar este período mais leve e produtivo, lembra o também psiquiatra Rogério Cardoso. “A ideia é fazer deste limão, uma limonada.” Na web, grupos de ajuda pipocam nas redes sociais, com o propósito de fazerem companhia na quarentena e não deixar aumentar o sofrimento de pessoas, por exemplo, que tenham síndrome do pânico.

“Cada um reage de acordo com suas possibilidades e de acordo com suas circunstâncias internas. Para quem tem uma boa rede de amizade, mais recursos financeiros, pode ser mais fácil que para outras pessoas. Para quem tem problemas psicológicos ou mentais, isso pode afetar”, aponta Clarice. De acordo com a médica, que também é psicoterapeuta e psicanalista, a chegada abrupta do coronavírus mexeu profundamente com a vida de algumas pessoas. “De repente elas têm sua vida virada de cabeça para baixo”, reforça. “Têm pessoas que vão ficar muito mal com a hipótese de permanecer em casa. Têm pessoas que são pessimistas e imaginam que é um problema mais grave do que é. Outras que são tristes, se abatem mais rapidamente. Há pessoas muito ansiosas, pensando naquilo o tempo inteiro”, relaciona Cardoso.

De acordo com os especialistas consultados pelo Correio do Povo, o contexto atual é repleto de fatores que podem acabar aprofundando os sintomas das psicopatias e até mesmo tirar a tranquilidade. “Aumenta a tensão entre os familiares. A gente tem que tentar relevar as coisas nessas horas”, pensa Clarice. Males como ansiedade, depressão e pânico são mais sujeitos ao agravamento dos sintomas. “Pessoas com TOC podem se sentir mais entendidas. Geralmente estas pessoas têm uma forma exagerada de ver o mundo e agora todos nós temos este tipo de comportamento. Claro que depois, tem um efeito complicado, deletério”, pontua.

A psicoterapeuta afirma que as pessoas devem estar atentas aos quadros de depressão. “O ‘ficar preso’ pode aumentar o consumo de substâncias como álcool. A gente vai ter ainda muitos casos de depressão”, prevê. A médica psiquiatra e psicoterapeuta Clara Ester Trahtman também destaca a questão da síndrome do pânico. “O pânico tem que ser tratado. Tem que buscar ajuda. É importante seguir o tratamento, conversando com seu terapeuta. A pessoa que está isolada e sozinha tem que estar de bem consigo”, reforça. Para quem, em tese, aparenta boa saúde mental, Clara lembra: “Temos que saber lidar com esta incerteza. Termos capacidades cerebrais para se autoajudar”.

Cardoso diz que este período de isolamento social deve ser aproveitado como forma de prevenir a piora e até mesmo o surgimento de psicopatias. “Deve-se achar rotinas dentro de casa. Vejo que os jovens têm muito de ficar jogando online. Eu, por exemplo, estou fazendo o imposto de renda. Fico em casa resolvendo o problema do imposto”, exemplifica o médico. “Tem pessoas que gostam de ficar quietas, pensando na vida, mas têm as que não conseguem ficar quietas. Tem gente que gosta de limpar sua casa, de costurar, fazer crochê e tricô. São pessoas que fazem questão de se ocupar para fazer com que este tempo não seja doloroso”, conta Cardoso.


“Se uma pessoa tem depressão, a tendência vai ser ela se entregar. Importante é não ficar de pijama o dia todo. Tentar fazer exercícios físicos, usar técnicas como a meditação. Fazer todas as coisas que forem possíveis”, orienta Clarice.

Grandes desafios com os pequenos em casa

Com a decretação do isolamento social como forma de prevenção da Covid-19, as escolas pararam suas atividades e, com isso, as crianças tiveram que ficar em casa. A situação prejudica o aprendizado delas e ao mesmo tempo pode atrapalhar pais que estejam atuando em regime de home office durante o período. A jornalista Daiana de Souza, 41 anos, mãe da Brigitte, de 3 anos e 7 meses, conta que a interrupção das atividades escolares foi um choque, embora concorde com a iniciativa. “Ela recentemente havia começado a ir na escola. Estava se adaptando super bem. E, repentinamente, depois de já estar habituada a nova rotina, teve que parar”, descreve. Daiana acrescenta que a filha vive perguntando quando irá para a escola.

Com a pequena em casa, a rotina precisou mudar. “Costumo exercitar o ócio mesmo. Não a encho de atividade e tento deixar ela livre pra descobrir o que fazer”, relata. Daiana diz que tem visto muitos pais atucanados em tentar achar atividade o tempo todo para entreter as crianças. Para a médica Clara, é salutar fazer algumas atividades com as crianças, como brincadeiras, joguinhos, redações, etc. “Também é preciso dar uma resposta mais simples para as crianças. Tem que explicar que vai passar, que é só um período”, recomenda. A mãe da Brigitte diz que a filha segue pedindo pra ir junto no mercado e também pra ir nas amiguinhas. “Ela ainda pede para ir na vovó, que está na praia - isolada também -, e até para andar de bicicleta na calçada. Explicamos para ela a realidade: tem um vírus e todo mundo está em casa, que está tudo fechado. Todos os dias é o mesmo ‘exercício’ para explicar sobre a realidade”, revela Daiana. Outra forma de ocupar o tempo dos pequenos, segundo Clara, é estimular o voluntariado nas crianças. “Elas entendem, são receptivas neste sentido”, defende.

O ambiente em casa também precisa se manter em dia, acredita a psicoterapeuta. Em dias de pandemia, a preocupação e a angústia também podem tomar conta da cabeça dos pais. “Este momento é um desafio a todos. É natural que fiquem ansiosos, pensando que não se tem controle. Tem que se pensar que vai passar, vai levar algum tempo, mas vai passar”, destaca Clara. “É tentar manter a tranquilidade dentro do possível. Manter a rotina em casa, usar seu capital mental para manter o sistema imunológico bem. Se propor a ter alguma diversão. Sempre tem algo a ser feito.”

Siga em frente


No Facebook, apesar de ser território fértil para as fake news, há bons grupos a quem enfrenta dificuldades com a sua saúde mental. A produtora de conteúdo e estudante de produção fonográfica Antônia Kowacs tem observado o desenvolvimento destes grupos desde que começou a pandemia. “Há um grupo que já existia pré-Covid, ‘a group where everyone is approved in 5 seconds’ que é enorme e que tem pessoas do mundo inteiro. Antes era de interação, com memes, etc, e, desde que o coronavírus começou a se espalhar, virou cada vez mais um grupo de relatos sobre os casos. Têm relatos de italianos, americanos, gregos”, destaca. Segundo Antônia, há também o “Share your quarentena” e o Quarentena Compartilhada. A diferença entre os dois, é que o segundo é um grupo aberto, portanto, requer mais cuidado sobre o que se vai compartilhar. Outra dica da Antônia é o Quarentena Feelings, que tem como propósito “gerar pertencimento e risadas”. Também tem o “Quarentena - Apoio psicológico”, que vai na linha de literatura de autoajuda e é aberto. O próprio Instagram criou um stick para postar no stories, denominado #emcasa, como forma de incentivar a troca de experiências entre as pessoas durante o isolamento ou quarentena.

As várias entidades que agregam profissionais da saúde mental no Rio Grande do Sul, por meio da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA), estão oferecendo auxílio voluntário a profissionais da saúde e comunidade em geral para qualquer pessoa que queira conversar remotamente por alguns minutos sobre seus sentimentos de solidão, desamparo, desespero, angústia de morte, medo ou pânico. As pessoas podem contatar a SPPA pelo telefone (51) 3224-3340 ou acessar o site www.sppa.org.br, na internet. O Centro de Valorização da Vida (CVV), que já faz trabalho de prevenção ao suicídio desde a sua fundação, em 1962, atende em Porto Alegre, 24 horas por dia, pelo telefone 188. No site www.cvv.org.br, há também a opção de chat e e-mail para quem precisa de ajuda.

Os médicos destacam também a necessidade de as pessoas seguirem com seus medicamentos. “As pessoas que estejam em tratamento, que sigam com o tratamento. Os pacientes poderão utilizar segunda via para retirar medicamentos controlados, para evitar deslocamentos desnecessários”, acrescenta Cardoso. “É lutar para não se entregar e continuar a tomar sua medicação. Muita gente continua sendo tratada a distância. Eu mesmo estou atendendo online”, conta Clarice. Mas não é só medicamento que resolve. Há outros caminhos para manter a mente sadia. “É importante que as pessoas usem este tempo para procurar informações e tenham cuidado para que estas informações sejam fidedignas. Por que tem muita coisa apavorante e mentirosa. Gaste um tempo razoável e depois largue isso e vá fazer outras coisas, como ginástica e pilates. Fazer coisas que gosta, aproveitar este momento. Fale com os amigos pela internet. São coisas que vão nos dar satisfação, tranquilidade”, recomenda Cardoso.

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